Embora meus pais nunca tivessem ouvido falar de pedagogia Waldorf, orientação na qual hoje educo o meu filho, posso dizer que tive um primeiro setênio belo. Como não havia muitos recursos para brinquedos caros, o jeito era lançar mão do que estava por perto e de exercitar a imaginação.
Mesmo crescendo em um bairro relativamente grande do Rio de Janeiro, costumava brincar no chão da cozinha da nossa casa com boizinhos de chuchu, bonecas de pano e com várias sobras de tecido que ganhavam mil formas nas histórias que inventava.
Em minha infância fui limitada no colecionar de álbuns de figurinhas (que eram bem caras para o orçamento da minha família), e de sonhos de consumo como o Atari, o patins e muitos outros que se quer recordo. Meus pais ou não tiveram recursos ou simplesmente não acreditavam que ali estaria algum tipo de felicidade que efetivamente fosse essencial para minha formação.
Aprendi a conviver com essa negação. E, acredito, esse limite do que se pode ter e do que realmente é essencial, foi sendo forjado dentro de mim pelos exemplos que tive. Hoje, das lembranças que guardo de minha infância, não povoam brinquedos que tive ou os que não tive, mas as aventuras e descobertas que vivenciei neste período, como a primeira vez que tomei banho de cachoeira nas férias no interior de Minas, os banhos de chuvas e a cumplicidade dos primos e dos amigos.
Um dos brinquedos mais queridos de minha infância foi um buraco. Um enorme buraco aberto por seis mãos no quintal de minha avó. A finalidade era apenas abrir um túnel onde pudéssemos encontrar mãos e pés. A conquista deste objetivo foi comemorada em alto estilo com suco de uva e pão de queijo.
Recordo-me que em uma noite de forte chuva faltou energia na nossa casa e não tive que disputar meus pais com as novelas ou telejornais. Por cerca de uma hora e meia, brincamos de sombras nas paredes à luz de velas. Cheguei a pedir que faltasse luz todos os dias para que aquele momento se perpetuasse.
Hoje, como mãe, dou ao meu filho mais do que tive em minha infância, mas tento não cometer exageros. Isso acaba me gerando alguns conflitos internos, é claro, pois sempre achamos que poderíamos dar mais. Mais afeto, mais brinquedos, mais tempo juntos.
Neste Dia das Crianças, meu filho não recebeu nenhum presente material. Já havíamos dado há alguns meses um brinquedo que ele queria muito. Ele sabia que este seria o seu presente e não teria outro nesta data. Passamos o dia juntos, passeando e brincando. E percebi que não fez a menor falta para ele receber ou não um novo brinquedo neste dia.
Preocupada com o legado que estou deixando para meu filho, neste Dia das Crianças, perguntei a ele: “Quando você pensa na mamãe, o que te vem à cabeça?” Ele me respondeu: “Carinho”. Bom, eu não poderia ter recebido presente melhor.